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O que fazer do nosso sistema político?

Confira a coluna Praça Oito deste domingo, 23 de abril


A lista de Fachin e a revelação do teor das delações da Odebrecht expuseram ao povo brasileiro a autópsia de um sistema de corrupção institucionalizado no país há décadas, como afirmou, em delação, Emílio Odebrecht. Por meio dos depoimentos – sobretudo os de Emílio e de seu herdeiro, Marcelo Odebrecht –, revelou-se a apropriação da coisa pública pelo interesse privado e um modus operandi naturalizado pelos envolvidos, que transformou o Estado brasileiro em um balcão de negócios: de um lado, a elite empresarial do país (corruptores); do outro, a elite política (corruptos).

A lista de Fachin e a revelação do teor das delações da Odebrecht expuseram ao Brasil um sistema de corrupção institucionalizado no país há décadas
A lista de Fachin e a revelação do teor das delações da Odebrecht expuseram ao Brasil um sistema de corrupção institucionalizado no país há décadas
Foto: Amarildo

Entendendo que o atual sistema político brasileiro, introduzido pela Constituição Cidadã de 1988, deu a prova definitiva de ter falido de vez, não faltam pensadores a defender que estamos diante de um “período pré-Constituinte”: como o principal está dando muito errado, seria preciso repensar e reiniciar o sistema, a partir de uma nova Assembleia Nacional Constituinte. Mas nem todos pensam assim. O cientista político Sérgio Praça, por exemplo, professor da FGV-Rio, não acredita que o caminho passe por uma solução tão drástica.

“Acho isso muito distante e eu nem seria favorável a isso. Temos que continuar de acordo com as regras que estão aí, aguentar a paralisia por um ano e meio. Sou contra soluções drásticas como essa”, opina Praça. Quanto à antecipação das eleições presidenciais, que dependeria de iniciativa de Temer (em caso de falência total do seu governo), o professor vê tal hipótese, hoje, como bastante improvável. “Mas não de todo impossível.”

Em compensação, Praça vislumbra neste quadro de agravamento da crise política uma oportunidade para que seja implementada uma reforma política mais ampla e profunda. “Os partidos estão todos unidos agora. Estão todos no mesmo saco. Então existe uma oportunidade para que uma reforma política mais ampla seja aprofundada. A dúvida que fica é se essa reforma política será para protegê-los ou para dar uma resposta mais concreta para os escândalos. Uma reforma para protegê-los seria muito improvável, só criaria mais confusão. Uma reforma política com lista fechada até pode ser positiva a médio prazo. Mas esse Congresso não tem legitimidade para propor nenhuma reforma. Então na verdade o cenário mais provável é paralisia mesmo.”

Por seu turno, o cientista político José Luiz Niemeyer, da Unicamp, pondera que a Lava Jato já se incorporou ao cotidiano da sociedade brasileira e que o nosso sistema política brasileiro há de continuar, do ponto de vista da escolha dos candidatos através dos partidos políticos. “As coisas continuam. A Lava Jato tensiona o sistema, mas não quebra o sistema. Provoca uma tensão constante. Ninguém quer a quebra institucional, a desordem institucional. Querem a continuação da tensão. A casca do sistema não muda.”

A coluna pergunta a Niemeyer se ele acredita que a lista de Fachin e seus desdobramentos implodem de vez o sistema político brasileiro? “Não”, responde ele, sem hesitação. “Tensiona mais. É mais um nível de tensão na corda a que chamamos Lava Jato, mas não quebra a outra ponta, que é o sistema.”

Quanto à ideia da Constituinte, Niemeyer se posiciona em um ponto intermediário, sustentando a proposta de uma instalação de uma mini-Constituinte, não para se rever toda a Carta Magna, mas para tratar especificamente da reforma política. “Era importante uma mini-Constituinte específica para a reforma política, porque o Congresso não fará isso. Agora, melhorar o sistema representativo não significa quebrar o sistema”, assinala o mestre.

Análise

Estamos convivendo com a Lava Jato há três anos, e a operação já virou uma questão conceitual. É uma investigação sobre a maneira como os políticos e os dirigentes partidários atuam junto ao setor privado visando a um projeto eleitoral. Então a Lava Jato já é um projeto estrutural, que ganhou um conceito, ao contrário do mensalão, que teve um caráter mais específico do que sistêmico. Então a investigação já virou parte do próprio sistema político brasileiro. Não é mais um riacho, mas um rio caudaloso. Isso faz com que cada novo fato continue importante, mas que perca impacto. Todos os dias somos bombardeados. Com isso, não é que a operação perca força e apoio, mas faz com que a gravidade se dilua. Há um lado positivo nisso, porque a Lava Jato vai durar muito tempo. Então nada vai derrubar a estrutura, a ordem do sistema político no seu grande desenho. Queremos a democracia de massas, com ampla participação social, com mecanismos aprimorados de democracia representativa, o modelo representativo via partidos. Queremos os partidos fortes, porque eles têm uma importância estrutural e sem eles não há democracia. O partido fica, os agentes passam. O sistema política brasileiro, do ponto de vista da escolha dos candidatos, vai continuar. As coisas continuam. A Lava Jato tensiona o sistema, mas não quebra o sistema. Provoca uma tensão constante. Ninguém quer a quebra institucional, a desordem institucional. Querem a continuação da tensão. A casca do sistema não muda.

JOSÉ LUIZ NIEMEYER Cientista político (Unicamp)

Trecho revelador

A coluna de hoje destaca um trecho do depoimento do ex-presidente da Odebrecht Infraestrutura Benedicto Júnior sobre o ex-governador Renato Casagrande (PSB), talvez o mais elucidativo sobre os reais interesses da empreiteira ao financiar esse e outros candidatos no Estado.

Mercado promissor

“O Sérgio (Neves) ponderou que Vitória é um mercado que (...) não havia uma leitura de que haveria obra pública. Havia uma percepção de que a forma de resolver esses problemas de infraestrutura de Vitória que vinham se agravando nos últimos anos eram PPPs. E a gente tinha olhado o plano de governo. Havia algumas ideias claras de alguns projetos que poderiam interessar à Odebrecht. O segundo ponto é que Dr. Renato Casagrande acabou se agregando a uma coligação que estava sendo liderada pelo na época governador, Paulo Hartung. Então foi feito um grande conglomerado de partidos, e intitulou o Dr. Casagrande como o candidato dele. Então a probabilidade de ele ganhar era muito grande. Então isso por si só já nos dava a possibilidade de ter projetos de PPPs.”

ELEVADOR DESATIVADO

Sim, ele existe! Ao receber a coluna em seu gabinete há alguns dias, o prefeito de Vila Velha, Max Filho, fez questão de mostrar o já lendário “elevador privativo”, agora desativado, que seria diariamente utilizado pelos antecessores de Max no cargo, Neucimar Fraga (PSD) e depois Rodney Miranda (DEM).

Elevador privativo da prefeitura de Vila Velha está desativado
Elevador privativo da prefeitura de Vila Velha está desativado
Foto: Divulgação

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